É necessário neste primeiro momento entender o que diz o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil, Lei 8.906/1994, quando o assunto é prerrogativa, vejamos:
Art. 7º São direitos do advogado:
III – comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis.
A intenção do legislador é proteger a atuação do advogado, no uso de suas prerrogativas, para conversar com seu cliente de forma reservada, justamente para evitar maiores constrangimentos para a pessoa do preso e todos os demais presentes na delegacia.
Porém, a contradição ocorre na prática. Muitas das vezes os agentes públicos desconhecem o direito do advogado, e o advogado nada faz quando deveria. Primeiro que, por uma questão de desconhecimento da norma, não autoriza sua violação de forma reiterada, e o advogado que não reclama seus direitos estará em breve sendo devorado na prática criminal.
Muito comum ocorrer esses tipos de casos em comarcas pequenas, onde está presente somente autoridade policial e mais um agente público, e aí começa a violação do seu direito quando desejar conversar com seu cliente de forma reservada. Por isso, aqui vai algumas dicas do que fazer nesse momento desesperador.
1º NUNCA faça atendimento sem a presença de mais um colega. Se possível;
2º NUNCA fale com o cliente na frente dos agentes de segurança pública. A finalidade aqui não é prejudicar o bom andamento da investigação, e sim resguardar a imagem do preso e informações relevantes para boa condução processual pela defesa;
3º Se não for possível falar com seu cliente de forma reservada, procure a autoridade policial para relatar o ocorrido. Se for ele o agente violador da norma, impetre Mandado de Segurança SEM MEDO!
A jurisprudência é forte nesse sentido, vejamos o acordão concedido no Mandado de Segurança que foi impetrado por advogados:
MANDADO DE SEGURANÇA. ESTATUTO DA ADVOCACIA. ACESSO A DETENTO. VEDAÇÃO. GREVE DOS AGENTES PENITENCIÁRIOS. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO DO CAUSÍDICO E DO DETENTO DE REALIZAREM ENTREVISTA RESERVADA E PESSOAL. 1. Preconiza o artigo 7º, III, do Estatuto da Advocatícia que é direito do advogado comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis. 2. Também dispõe o artigo 41, IX, da Lei de Execuções Penais e a Convenção Americana de Direitos Humanos que o preso tem direito à entrevista pessoal e reservada com seu advogado. 3. Configura violação a direito líquido e certo dos patronos o impedimento de se reunirem com seus clientes durante o período de movimento grevista deflagrado por agentes penitenciários. 4. Segurança concedida. (Número Processo – 0701900-49.2016.8.07.0000)
Agora, feita essa rápida explanação do EAOAB passaremos de forma breve e efetiva no dispositivo legal da nova lei de abuso de autoridade, Lei 13.869/2019, que vai resguardar toda sua atuação nas delegacias, vejamos:
Art. 20. Impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado:
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
O artigo 20 da nova lei ainda é composto por parágrafo único aplicável para aqueles que estão em audiência, e que por ser outro tema relacionado a outro tipo de atendimento, não farei considerações. Por isso, vamos tratar especificamente desse atendimento na delegacia.
Mais uma vez o legislador, desejando proteger os direitos do Advogado, trouxe uma norma que veda uma conduta negativa por parte dos agentes de segurança pública. Aquele que impedir o atendimento reservado do advogado com seu cliente vai receber uma pena de detenção de seis meses a dois anos e multa.
Aquilo que no “papel” é bonito, na prática vai causar uma incerteza, uma vez que o legislador descreve que o agente pode impedir se houver justa causa. A “justa causa” torna-se um buraco negro por ausência de condutas concretas, e claro, mais uma vez deixou o legislador de justificar o que se entende por “justa causa”.
Sendo assim, a qualquer momento a “justa causa” poderá ser invocada tornando o fato atípico. Ainda não existem decisões sobre esse ponto, portanto, fique de olho. Faça o que for possível para atender o cliente de forma reservada e, assim, colherá bons frutos de sua atuação na delegacia. O advogado deve ser guerreiro e ponderado em suas condutas, por isso lute por suas prerrogativas. Uma vez violada a prerrogativa, sofre o advogado e a sociedade brasileira.
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